É sabido que a Lei nº 11.638, de 2007, ao dar nova redação a  dispositivos da Lei nº 6.404, de 1976, alterou sensivelmente as normas  contábeis e, desde a sua edição, vem sendo intensamente discutida entre  os operadores do direito e da contabilidade.
Entre os temas debatidos está a supressão da conta de lucros acumulados  nas sociedades anônimas. A nosso ver, o vocábulo supressão, nesse caso,  é erroneamente utilizado, pois a Lei nº 11.638, de 2007 não a eliminou,  apenas lhe conferiu caráter transitório, sendo zerada ao fim do  exercício social competente.
O intuito primordial do legislador ao proceder tal mudança foi proteger  os minoritários que, não raras vezes, não dispunham de meios para se  opor aos controladores quando da retenção dos lucros líquidos do  exercício que, ao argumento de não descapitalizar a companhia,  destinavam-nos à conta de lucros acumulados.
Com efeito, a prevalência da vontade dos majoritários em reter os  lucros sociais afronta os princípios norteadores da legislação  societária em vigor, vez que a finalidade social da companhia é a  percepção de lucros e, por óbvio, o direto essencial do acionista é  participar destes.
Nesse cenário, a doutrina nacional recepciona positivamente a Lei nº  11.638, justamente porque limita o poder discricionário dos  controladores, proporciona maior transparência aos minoritários e também  maior segurança para novos investimentos na própria companhia.
O impacto de tal mudança ao cotidiano das companhias é grande, pois, na  prática, seus lucros líquidos em determinado exercício social, sem  destinação específica, serão obrigatoriamente distribuídos.
A nosso ver, a administração da companhia dispõe de duas saídas para a  não distribuição: inclusão de reservas estatutárias ou retenção dos  lucros sociais.
Com relação às reservas estatutárias, caso não sejam previstas no  estatuto social, a companhia deverá convocar uma assembleia-geral  extraordinária que tenha como ordem do dia a alteração do estatuto  social para a criação da reserva estatutária.
Salientamos que a redação da cláusula estatutária deverá indicar a sua  finalidade, de forma precisa, vez que é ilegal a criação de reservas  estatutárias que contemplem um objeto amplo ou indeterminado.
Já quanto à retenção dos lucros, a LSA prevê que a assembleia-geral  poderá, mediante proposta da administração, deliberar a retenção de  parcela do lucro líquido do exercício prevista em orçamento de capital  por ela previamente aprovado.
Para tanto, o orçamento deverá ser devidamente justificado,  compreendendo todas as fontes de recursos e aplicações de capital,  limitando-se a cinco exercícios, salvo se executado, por prazo maior, o  projeto de investimento. E, sendo o caso, as sobras orçamentárias  deverão ser distribuídas como dividendos no final do exercício.
Cabe ressaltar que ambas as saídas a não distribuição deverão ser  amplamente fundamentadas e não poderão ser constituídas, em cada  exercício, em prejuízo da distribuição do dividendo obrigatório,  limitando seu saldo ao capital social.
Ainda, vale mencionar que o artigo 3º da Lei nº 11.638 estendeu a  aplicabilidade das disposições da Lei das SA às sociedades de grande  porte - empresa ou conjunto de empresas sob mesmo controle com ativo  superior a R$ 240 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 300  milhões, no exercício social anterior -, mesmo que estas não sejam  constituídas sob a forma de sociedade anônima, como é o caso das  limitadas.
Nesse contexto, surge uma indagação natural: afinal, as sociedades de  grande porte devem ou não observar as regras da transitoriedade da conta  de lucros acumulados?
Não existe um posicionamento firme da doutrina nacional sobre o tema.  Há quem defenda que, pela determinação do mencionado artigo, as  demonstrações financeiras das sociedades de grande porte devem ser  elaboradas nos exatos termos da LSA e, por essa razão, deve ser  eliminado o caráter permanente da conta de lucros acumulados.
Mas existem opiniões no sentido de que não há a tal transitoriedade da  conta de lucros acumulados às sociedades de grande porte. Esta tese está  amparada na Resolução nº 1.159, de 2009, do Conselho Federal de  Contabilidade, segundo a qual somente as sociedades anônimas não podem  mais apresentar saldos positivos nessa conta a partir do exercício  social de 2008.
O que se pode concluir é que, pelas modificações da Lei nº 11.638, os  minoritários têm um instrumento que lhes permite receber os lucros  auferidos pela companhia, porquanto não é mais autorizado o seu  lançamento em contas de lucros acumulados. É possível, entretanto, que a  companhia se valha de procedimentos com vistas a não distribuição. Além  disso, a obrigatoriedade das novas regras para as sociedades de grande  porte que não sejam constituídas sob a forma de sociedade anônima ainda é  duvidosa e demanda que cada empresa faça suas reflexões a respeito.
Fonte: Cláudia Soares Garcia in Fenacon
Fonte: Cláudia Soares Garcia in Fenacon

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